segunda-feira, 28 de março de 2011

Das minhas incertezas

Você nunca me prometeu nada.
Na verdade, o que fiz foi meticulosamente preencher seus silêncios. Desenhar cercas em miragens com seus balbúcios ininteligíveis. Interpretar seus pequenos gestos, seus sorrisos e seus olhares de indagação.
Você nunca mentiu pra mim.
Na verdade, o que fiz foi incessantemente preencher seus detalhes. Incorporar informações às paisagens pintadas por suas omissões. Relevar seus pequenos sinais, seus desvios e seus lapsos de ingratidão.
Não que eu tenha tido intenção de me enganar. É que eu achava o mistério um impossível teatro. Cria que não poderia haver nada que se escondesse por fim. Pensava num prazo de validade para o desconhecido.
No entanto, por todas as vezes em que me aproximei mais de você, em que me afastei mais de você, e quando achei que era possível, você sumiu. Aparecia sempre um outro desconexo, que exigia de mim um processo cognitivo refeito desde o início.
Na verdade, o que fiz foi te amar gratuitamente.
Coloquei meu coração sobre a roleta, apostando na supremacia do vermelho sobre o negro. Quando finalmente chegasse a hora do luto, já teria apostado o suficiente no pulso do sangue. O coração, cansado de bater, satisfeito estaria mesmo ao fim do sentimento desfeito. Uma aposta.
Uma aposta é um tiro no pé.
Eu poderia, atirando de olhos fechados, errar o pé.
Poderia traumatizá-lo para sempre, encerrando minha possibilidade de caminhar.
Poderia feri-lo levemente, deixar uma cicatriz como memória, e correr em direção ao mar.
Mas eu jamais imaginaria que apostar em você seria atirar no pé com a roleta da pistola vazia de balas. E na minha ignorância das balas, brincar de apontar para a cabeça, para o coração, até que, de súbito, um tiro inesperado me acertaria. Tenho a impressão de que você percorreu meu corpo violentamente. De que você deixou um rastro da cabeça aos pés. E de que sua marca ficará em mim sem escolha.
Ocasionalmente, penso em tirar minhas fichas da mesa, mas não posso. Há em mim uma compulsão pelo desfecho. Quando penso que seria melhor não ver o que há de possível nisso, me impressiono, e sinto meu peito apertar, com uma angústia profunda que me prende ao feltro verde.  Lembro-me da minha vontade de te conhecer. E de te espreitar, até que seja uma janela aberta. Por fim.

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