segunda-feira, 28 de março de 2011

da nova literatura

Cansada de reler a prosa de antigamente, quis culpar os livros lidos e, sobretudo, os livros não lidos pela escrita desinspirada que viera com os anos. Quis culpar o sistema, a rotina, os números do dia a dia, a correria. Nada que me abrisse os olhos para admitir que a literatura se havia descolado de mim, placenta, abortiva. Todos aqueles embriões de ótimos textos eutanázios na décima sexta linha. O descaso todo com a continuidade. A preguiça mental da chave de ouro, o espaço excessivo à pausa. Hesitante. Na palavra e na não palavra. Via hesitação em todos os meus dizeres e em todos os meus silêncios. Quis culpar a in-utilidade. Como se meus textos inúteis discutissem entre si sem consenso sobre sua insignificância.

Racionalizando um pouco menos, agressivamente um pouco menos, cheguei a ver beleza naquelas palavras. A semente da raiva se aquecia, de fato, entre as raízes daquelas palavras. Aquelas raízes que secaram na salinidade do solo. Tentei em vão resgatar meus antigos motes, quem sabe, sobre os quais pudesse versar ainda uma vez. Mas eram todos homens mortos, sonhos mortos, ideias mortas que não tinham lugar em mim.

A verdade é que a literatura tinha assistido a minha morte prosaica. Com a cumplicidade embaçada de catarata. Tinha-me encontrado na ordinareidade dos pensamentos que não merecem ser escritos.

Adoeci.

As palavras fracas, uma sangria desesperada para que sobrevivessem ainda. Qual o quê! De nada me serviam as antigas rimas e os enjambements de que me orgulhava. Desde que perdi a forma deixando que as linhas corressem sem pausa. Até que as perdi de vista. Cavalos chucros, levaram-me por bosques densos em que não me achava. E reinaram assim no meu reino selvagem por anos a fio.  

Foi quando mesmo lendas encantadas deixaram de ser contadas. Foi quando não vi motivo para contar nada. Foi quando descobrir que nada havia a se contar.

Então, de leve, piscaram-me os olhos de pestana miúda. Cocei-os de leve, como me alcançasse o sono. Pensei mesmo sentir formar-se uma lágrima. Aquele calor úmido que se sente por cima das retinas. É quando se pisca. E permaneci ainda piscando por milissegundos a fio, para que secasse a lágrima. Não queria regar a semente do texto. Queria deixar aquela inspiração ali fechada, fecunda, até que brotasse, naturalmente, em flor.

Foi quando me deixei descansar de olhos fechados e tive esperança.

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