domingo, 5 de dezembro de 2010

Se eu entrasse em colapso, alguém jamais desconfiaria? Se me perdesse em tantas conjecturas e nunca mais encontrasse saída do meu próprio pensamento? É um risco que se corre?

Não consigo precisar quanto tempo gasto dentro de mim. Revisito o mundo a cada instante, rearranjando memórias e criações espontâneas num cenário diverso. Comparo pessoas e seus comportamentos, disparo gatilhos mentais que decidem por mim. Nunca tive consciência de estar decidindo quando tomei as decisões mais importantes.

Lembro que, quando era criança, tinha uma fixação específica por um pensamentozinho: o que tem quando acaba o universo? Sendo infinito, o que havia antes? Era tudo cinza?

Sempre imaginei o pré-universo como um cinza sem borda. O universo foi uma aquarela para combater todo aquele cinza. Nasceram estrelas que pudessem morrer para que houvesse brilho. Para que o brilho ofuscasse os astronautas. Para que os astronautas acreditassem no infinito. Eu quis ser astronauta. Disseram que não poderia ser astronauta porque os astronautas não podiam ser pessoas altas. Acho que mentiram para mim. Mas eu nunca deixei de acreditar no infinito.

O infinito deve ser uma das coisas mais bonitas de se existir. Porque, afinal de contas, o fim é sempre o mais triste. Como o chocolate no fim. Como o amor no fim. Tenho certo receio da expressão 'o fim do sofrimento'. Tanto como finalidade quanto como término. Poderia o sofrimento ter qualquer um dos dois?

Exatamente em qual momento inventaram a palavra para o sofrimento? Acho uma boa palavra. Sofrimento parece uma palavra em si sôfrega. No entanto, o sofrimento não me parece tão natural como sua palavra. Como será que se inventou o sofrimento? Como funciona isso? O sofrimento é infinito porque não sei ver quando começa e quando termina. Como o universo. O universo foi o sofrimento de uma estrela. O sofrimento foi muito além da estrela, e alcançou o infinito. Por isso não posso ter em mim sofrimento: é maior do que eu. O sofrimento é uma externalidade com a qual lido de tempos em tempos. Mas seria mentira dizer que o tenho em mim.

É como dizer que se tem alguém. Não há pessoa que caiba em outra. Nem a pessoa que existe, a imagem que todos fazem de um conjunto de corpo e atitude. Não existem pessoas em si. E não se pode colocar nada naquilo que não existe. Tampouco atribuir propriedade a um proprietário inexistente. Por isso as pessoas não são umas das outras. Porque não existem.

Já conheci várias pessoas e essas pessoas nunca foram conhecidas por outras. Quando me contavam, sempre tive certeza de que haviam conhecido outras pessoas. Por mais que eu tente explicar a pessoa que conheço, ela nada tem a ver com a pessoa do outro conhecida. Fico pensando às vezes quantas pessoas conhecem em mim. Será que são muito diferentes? Será que são todas verossímeis? Será que se eu conhecesse uma pessoa em mim saberia que sou eu?

Por que esse tipo de pensamento me ocorre antes de dormir? Não me lembro de ter pensado sobre isso antes. Estranho pensar que se pense sobre algo mais de uma vez. Não faz sentido. Tendo pensado a primeira vez, a coisa já está resolvida: qualquer pensar que se insista será sobre algo já diferente.

Eu não saberia dizer por que pensamos tanto. É um esforço absurdo para parar. Eu nunca consegui. Tentei já por várias vezes, mas sempre encontrava no fundo o pensamento sobre o não pensar. Sendo assim, desisti. E agora estou presa nos meus próprios pensamentos. Só consigo fugir deles quando durmo. Tentemos.

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